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sexta-feira, 14 de outubro de 2016

A OVELHA NEGRA (Hrútar) Islândia, 2015 – Direção Grímur Hákonarson – elenco: Sìgurdur Sìgurjónsson, Theodór Júlíusson, Charlotte Boving, Jón Benónýsson, Gunnar Jónsson, Porleifur Einarsson, Sveinn Ólafur Gunnarsson, Ólafur Ólafsson – 93 min

UM INTERESSANTE E DELICADO ESTUDO SOBRE PERDA E SOBRE A QUAL UMA CIDADE SE SUSTENTA NA ISLÂNDIA  


Com imagens visualmente impressionantes e um elenco coeso no endurecimento necessário aos personagens, esta obra-prima do cinema islandês (raro de se ver aqui no Brasil) é um filme bastante curioso que prende a atenção não apenas pela realidade bem específica que apresenta, mas também pelos próprios elementos dramatúrgicos que entrega ao espectador em uma história difícil, mas de certa forma singela e tocante. A OVELHA NEGRA ganhou o prêmio principal da mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes 2015 e foi o candidato da Islândia na corrida ao Oscar 2016 na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, mas injustamente ficou de fora dos pré-selecionados. O filme foi exibido na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. É um trabalho minimalista tanto no realismo quanto no absurdo da história inspirada em fatos reais de pastores locais, e demonstra um precioso equilíbrio entre melancolia e humor, rigor estético e singelo apelo emocional. 


Na Islândia, as ovelhas possuem um papel econômico e cultural de extrema importância para o seu povo. Lá existem mais ovelhas do que seres humanos e os animais são adorados pelos seus donos. O cineasta faz questão de situar o espectador neste contexto logo nos primeiros minutos do filme, apresentando-as como figuras quase divinas e, por este motivo, passíveis de um sentimento de devoção. Concursos do melhor cordeiro são realizados todo ano, causando imensa expectativa entre os fazendeiros. Após um destes torneios, um dos derrotados decide “investigar” o animal ganhador e logo desconfia que ele possui scrapie, uma perigosa e contagiosa doença que ataca o cérebro e a medula espinhal – uma espécie de “vaca louca das ovelhas”. A notícia logo se espalha, o alerta é dado e, com a doença confirmada, nada mais resta a não ser iniciar a quarentena do local. O que significa matar centenas de ovelhas, das mais diversas fazendas, para evitar que a contaminação se alastre. A rotina de todo o vilarejo é modificada. É neste cenário que vivem os irmãos Gummi (Sìgurdur Sìgurjónsson) e Kiddi (Theodór Júliússon), dois dos criadores mais experientes e respeitados do país e que, mesmo morando em fazendas vizinhas na mesma propriedade, não se falam há mais de quarenta anos. Ambos, cada qual a sua maneira, tentam salvar suas criações do sacrifício decretado pelas autoridades. O diretor usa sua experiência como documentarista para retratar o cotidiano dos criadores e seus rebanhos de ovelhas, enquanto mescla o registro com um tom de fábula. 


Através de longos planos, geralmente estáticos, de zooms que se aproximam lentamente para revelar detalhes de objetos ou das expressões de seus personagens, e de enquadramentos perfeitamente simétricos, Grímur Hákonarson – que cita o russo Andrei Tarkovsky e o finlandês Aki Kaurismäki como influências estéticas – capta este conflito fraterno, bem como as belíssimas paisagens nevadas da Islândia, mantendo também uma constante atmosfera cômica. O humor negro da trama, por vezes beirando o absurdo, se intensifica aos poucos, gerando momentos genuinamente divertidos, como as cenas com o cachorro que entrega os recados enviados entre os irmãos ou a sequência envolvendo a embriaguez de Kiddi e uma escavadeira. O diretor faz, então, com que seu foco na relação com os animais evolua para o da relação entre os seres humanos, transformando os elementos do universo particular de sua história em temas de apelo muito mais abrangentes: a mágoa, o arrependimento, a família, a fraternidade e a redenção. Pois se existe um momento em que estas características da humanidade afloram é no momento de união em torno de um interesse comum. Para Gummi e Kiddi, mais do que a atividade que os sustenta, perder suas ovelhas significa perder sua identidade, perder o único elo com sua história, seu passado. E acertar as contas com esse passado soa como algo inevitável. À medida que a trama caminha para seu desfecho, e os segredos congelados de outrora voltam à tona, os irmãos parecem regredir para tempos mais afetivos em suas memórias, culminando em uma simbólica volta ao útero, apresentada num dos mais belos planos do filme. Um filme universal que merece ser conferido!!!!

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